O que são síndromes hereditárias?

O que são síndromes hereditárias?

O câncer de mama é uma doença complexa e heterogênea, com vários fatores de risco influenciando sua ocorrência. Dentre estes fatores de risco, as síndromes hereditárias desempenham um papel crucial na predisposição dos indivíduos a desenvolver a doença. Este texto tem como objetivo fornecer uma visão abrangente acerca do risco para desenvolvimento do câncer de mama em pacientes com síndromes hereditárias, enfatizando a importância da detecção precoce e de estratégias de manejo personalizadas.

1.O que são síndromes hereditárias?

As síndromes hereditárias associadas a risco aumentado de desenvolvimento do câncer da mama são condições genéticas que predispõem os indivíduos a uma maior probabilidade de desenvolver câncer da mama em comparação com a população em geral. Essas síndromes geralmente envolvem mutações em genes específicos e seus padrões de herança podem variar. 

2.Teste genético 

Os testes genéticos desempenham um papel fundamental na identificação de mutações hereditárias. A partir da análise do DNA de um indivíduo é possível identificar mutações ou alterações específicas em genes associados a um risco elevado de câncer de mama. De modo geral, é recomendado para indivíduos com histórico familiar significativo de câncer de mama ou de ovário, câncer de mama em idade precoce, múltiplos membros da família afetados ou origens étnicas específicas associadas a uma maior prevalência de certas mutações. Muitos genes podem ser avaliados, porém os mais comumente testados são BRCA1, BRCA2, TP53, MLH1, MSH2, MSH6, PMS2, EPCAM, PTEN e CHEK2. Essa testagem ocorre a partir de uma amostra de sangue ou coleta de saliva, sendo a amostra enviada a um laboratório para análise. 

Após a realização de um teste genético, três são os resultados possíveis:

Resultado Positivo: indica a identificação de um gene que está associado a aumento do risco para câncer de mama. Esse aumento varia de acordo com o gene identificado. 

Resultado Negativo: teste genético negativo indica que nenhum gene associado a aumento da ocorrência de câncer de mama foi identificado. Porém, é importante ressaltar que um resultado negativo não significa que o individuo testado não poderá desenvolver câncer de mama ao longo da vida, dado que a maior parte dos casos de câncer de mama ocorrem em pessoas sem alterações genéticas identificadas. 

Variante de signifiado indeterminado (VUS): trata-se de um teste que identifica genes alterados em relação a população geral, porém, com base nos dados cientificos disponíveis não se sabe se são genes que podem aumentar o risco de câncer de mama. Diante desse resultado, é obrigatória a realização de vigilância em relação aos novos estudos que possam definir o papel exato desses genes.

3.Compreendendo as síndromes hereditárias

Dentre as principais mutações genéticas associadas a aumento do risco para carcinoma de mama, destacam-se as associadas aos genes:

  1. Mutação nos genes BRCA1 e BRCA2: tais genes são supressores de tumor envolvidos no reparo do DNA. Uma alteração nesses genes de reparo pode levar ao desenvolvimento do câncer de mama, dado que as alterações ocorridas normalmente no processo de divisão celular não serão corrigidas de modo adequado, gerando células com algum “defeito”. O padrão de herança dessas alterações, isto é, o modo como é transmitida essa alteração entre os indivíduos, é através de herança autossômica dominante, o que significa que um indivíduo só precisa de uma cópia alterada do gene de qualquer um dos pais para ter um risco aumentado.
  2. Síndrome de Li-Fraumeni: envolve mutações no gene TP53, um gene supressor de tumor responsável por regular a divisão celular. Indivíduos com síndrome de Li-Fraumeni têm maior suscetibilidade a uma variedade de tipos de câncer, incluindo câncer de mama, geralmente em idade precoce, além do aumento do risco de sarcomas, tumores cerebrais e tumores das glândulas adrenais.
  3. Síndrome de Lynch (câncer colorretal hereditário sem polipose – HNPCC): nesta síndrome há mutações nos genes MLH1, MSH2, MSH6, PMS2 e EPCAM, envolvidos no reparo de incompatibilidades de DNA. A síndrome de Lynch predispõe principalmente ao câncer colorretal e endometrial, mas também está associada a um risco aumentado de câncer de mama.
  4. Síndrome de Cowden: envolve mutação no gene PTEN, um gene supressor de tumor. Indivíduos com síndrome de Cowden apresentam risco elevado de câncer de mama, juntamente com maior suscetibilidade a câncer de tireoide e endométrio.
  5. Mutações CHEK2: herança autossômica dominante com mutação no CHEK2, um gene envolvido no reparo do DNA. Descreve-se aumento moderado no risco de câncer de mama, particularmente em mulheres com histórico familiar da doença. Há riscos elevados de câncer colorretal e de próstata.

É crucial que indivíduos com histórico familiar sugestivo dessas síndromes hereditárias sejam submetidos a testes genéticos. A identificação precoce destas mutações genéticas permite estratégias personalizadas de gestão e vigilância do risco, melhorando, em última análise, as possibilidades de detecção precoce e intervenções. 

As mutações genéticas não tem a mesma “chance’ de provocar câncer de mama. Dividimos o risco para a ocorrência de câncer da mama em categorias de alto e moderado risco, além, claro, do chamado “risco habitual”, a qual todas as mulheres estão sujeitas. A presença de mutações de alta penetrância associadas ao câncer de mama envolve vigilância intensiva, rastreio precoce e frequente (mamografia e ressonância magnética das mamas), consideração de cirurgias para redução de risco e medidas preventivas. 

Autor(a)

Livia Conz

Mastologista

Membro da Comissão de Genética e Alto Risco da SBM-SP